Em todos os momentos da História, seja na Antiguidade, na Idade Média, ou no nosso tempo, são as mesmas paixões e os mesmos desígnios que inspiram os humanos. Entender a História é entender melhor a natureza humana.

18 de agosto de 2015

Lessons from a Sheep Dog




Cheguei a este pequeno livro por acaso. Foi-me oferecido pelo meu marido, por sua vez, atraído pelo título e pela capa. Sobre o autor, Phillip Keller, não encontrei muito na internet, a não ser que nasceu no Quénia, em 1920, filho de missionários (brancos), e que escreveu vários pequenos livros sobre a religião cristã, nomeadamente, sobre como encontrar Deus na Natureza, tendo, por base, a sua profissão de pastor. Também foi fotógrafo do mundo animal.

Neste pequeno livro, não obstante as, por vezes, fastidiosas lições sobre a Bíblia, nota-se o enorme respeito que Phillip Keller votava à Criação Divina. Através da sua relação com a cadela pastora Lass, uma Border Collie, o autor faz um paralelo com a relação entre Deus e os humanos.

O livro cativou-me pela sua ternura. Phillip Keller, com vinte e poucos anos, acabava de se mudar de África para uma região inóspita do Canadá, na costa oeste, e adquirira um rebanho. Na sua procura por um bom cão pastor, deu com uma Border Collie mal tratada, num exíguo pátio de traseiras, na cidade mais próxima. A cadela, com cerca de dois anos, era mantida acorrentada por os seus donos não saberem lidar com a sua energia. Quando a soltavam, ela corria e atacava tudo o que se movesse, incluindo crianças de bicicleta.

Embora Lass o recebesse agressiva, Phillip Keller ficou com ela, mais por piedade do que por convencimento de que o animal lhe pudesse ser útil. E quase se arrependeu. Lass estava tão traumatizada, desconfiava tanto de humanos, que parecia impossível fazer algo dela. Manteve-a igualmente presa, durante algum tempo, para que ela não fugisse, mas Lass recusava-se a comer. Quando começou a ficar perigosamente magra, o dono soltou-a… E ela desapareceu na floresta.

Phillip procurou-a durante dias, perguntou nas quintas das redondezas… Em vão. Até que a viu no cimo de um rochedo, observando-o com as suas ovelhas. Levou-lhe comida, mas ela logo tornou a fugir. Phillip deixou a tijela da comida em cima do rochedo e constatou, na manhã seguinte, que estava vazia. Na sua sensibilidade, compreendeu que nada deveria forçar: ou Lass vinha ter com ele de forma voluntária, ou nada feito. Todos os dias ia deixar comida ao rochedo e todas as manhãs dava com a tijela vazia.

Um dia, estando a observar o pôr-do-sol no mar, no cimo de uma escarpa, com as ovelhas à sua volta, sentiu um narizito canino, muito tímido, a tocar nas suas mãos, atrás das costas. Phillip Keller designa esse momento como um dos mais bonitos da sua vida. E eu classifico essa cena como uma das mais comoventes que já li! Pela paciência revelada pelo humano e pelo ganhar de confiança de uma criatura traumatizada. Um momento, apenas, um toquezinho, que nos marca para sempre.

Phillip e Lass tornaram-se grandes amigos, revelando-se a cadela indispensável para o sucesso da quinta. Além de guardar e defender o rebanho de animais selvagens, Lass era exímia em reunir as ovelhas, que se espalhavam, ou se perdiam, nas redondezas, aprendendo a interpretar todos os comandos e sinais que o dono lhe transmitia.

Claro que esta linda história de amizade me encantou. Para o próprio autor, o mais importante foi, nas suas palavras, «o que Deus lhe ensinou através do trabalho com esse animal maravilhoso». O paralelo que ele estabelece com a relação entre Deus e os humanos, e que não é de desprezar, está bem patente nesta passagem:

«Deus depara connosco, muitas vezes, como eu deparei com Lass: no local errado, presos em fanatismo e teimosia, caídos em mãos erradas e mal tratados por um amo sem coração.
Esta importante verdade espiritual foi-me revelada naquela tarde, em que fui buscar a Lass, enquanto a dona não parava de reclamar sobre o comportamento mentecapto da sua Collie. Ela não fazia ideia do que um animal tão maravilhoso precisava, a fim de revelar as qualidades que lhe permitiam desempenhar uma atividade específica. Nada sabia, nem estava interessada em saber, sobre o desperdício de tão grande potencial daquela criatura de Deus.
A cadela, presa pela corrente e encolhida no pó, tornou-se, para mim, na imagem do destino de tantos homens e mulheres, que estarão dotados de qualidades específicas, mas que se encontram nas mãos erradas. Pessoas presas no desespero dos anos e das oportunidades perdidos».

Mesmo os leitores que abominam qualquer religiosidade hão de ver a beleza de sentimentos incluída nestas palavras…

Nota: li o livro em alemão, com o título Was mein Hirtenhund mich lehrte, sendo a tradução do excerto de minha autoria. A versão inglesa pode ser adquirida na Amazon.

Por acaso, gosto mais da capa alemã, que apresenta uma verdadeira Border Collie:






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